sábado, 16 de novembro de 2013

Vida Real


A vida real é bruta mesmo. Não há tempo para decorar monólogos ou ajeitar o cabelo. Palavras de amor quase nunca são respondidas com palavras de amor. Beija-se menos por amor que por acaso. A vida real não tem campos de flores, parques frios e silenciosos e xícaras generosas de café; às vezes nem copo de água tem. A vida real tem pouco de perfume e muito do cheiro forte do suor do trabalho pesado. Há muito mais rostos odiosos que sorridentes; muito mais pressa que apreciação. Há uma constante luta sangrenta por dinheiro, para qualquer lado a que se olhe. 


As perdas são tristes mesmo, e não há uma luz dirigente e maravilhosa para servir de guia; há só a vida continuando, mesmo diante do coração escoriado e ardido. Muito de conforto se nos tenta oferecer; mas pouco dele é sincero, e, ademais, pouco dele realmente serve. As feridas não cicatrizam de verdade, e cada passo seguinte é dado em função dos machucados anteriores. 

A vida real não é acompanhada por trilhas sonoras de magníficos pianistas, enquadrando cada nota perfeitamente às sensações, do júbilo à depressão. Não, há só um soprar tosco dum vento carregado de fumaça, as vozes das multidões inquietas, as buzinas irritantes dos carros na avenida... Nada segue o percusso direito. 

As pessoas morrem, e o que resta a fazer é chorar; chorar e não esquecer-se de continuar sem tentar cair. Quaisquer que digam em contrário, estarão ou caindo no erro da negação, ou caindo no erro do falso conforto. As guerras não cessarão tão cedo, e estamos fadados a ser expectadores das batalhas atrozes dos ardilosos e dos débeis, dos ricos e dos pobres, sem a certeza de que um dia haverá termo. 

 Na vida real, não há perdão verdadeiro; não há pombas ou coelhos brancos: há gaviões e serpentes. O caminho é só espinhos e pedregulhos; o horizonte é mal iluminado e incerto. Nós, humanos, errantes duma estrada de incerteza.  

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