sexta-feira, 6 de junho de 2014

Barcos de Porto





É nesses becos estreitos sem saída
Entre casas e mais casas
Nos ruídos certeiros de bolas de bilhar
Entre uma página e outra duma história bem contada
Ou suficientemente desinteressante pra fazer cochilar
Ou suficientemente grande pra que nos percamos
- Talvez seja aí que viva a felicidade

Talvez nem faça parte da vida, a felicidade
Quiçá venha de fora, de qualquer outro lugar
Escuro, sem luz, do universo afora
Quiçá more em qualquer pedacinho de nós
E aguarde ansiosamente para que acendamos seu pavio 
Para nos reconduzir com seu inestimável poder reintegrador

Quando é que a encontrarei?
Já a encontrei antes? Hei eu de encontrá-la?
Sei, eu, que já a vi – talvez não a tenha nem tocado

Eu a vi num genuíno e belo sorriso de uma miúda menina
À luz do sol do fim duma tarde como qualquer
Eu a vi no sol escaldante de meio-dia,
Enquanto caminhava por uma rua qualquer
E pensava no que viria a seguir [no que viria para todo o sempre
Eu a vi numa festa de luzes numa noite meio-fria do sudeste
Eu a vejo numa lembrança de campos esverdeados e canções sinceras da alma
Eu a vejo no castelo de Carrickfergus – numa vida que talvez tenha sido minha

Eu a vi no - eternamente gravado em mim – fim de tarde da bela, fria e santa Catarina
[As cores dançando no frio céu azul com divina suavidade]
E a vi também num pequeno menino dourado, numa tarde do sertão
E tornei a vê-la numa sala escura de boas-vindas e sorrisos vários
Vi-a no carnaval do Pelourinho e nas ladeiras de Olinda
Vi-a numa tarde quente e húmida do Rio Grande do Norte
Vi-a duma janela qualquer – janela escura de se mergulhar

Flagrei-a em sonhos surreais e em momentos palpáveis
Debrucei-me sobre livros e encontrei dela resquícios, também
E veio até mim quando os dedos de Pachelbel
Dançaram por sobre as teclas do piano em Canon
E vem até mim quando os divinos dedos de Gilmour
Dançam por sobre as cordas de guitarra
Como pode ser, então, que tão pouco a encontro?

Vejo-a nas lembranças
Vejo seus milhões de pedacinhos espraiados por cada singelo canto do mundo
Vejo-a no quebrar das ondas do mar na costa e no cheiro divino da maresia
Reparo-a na saudade de um milhar de pessoas e de ninguém
Por que não posso, eu, tocá-la?

E voa, a felicidade, junto aos pássaros dos fins de tarde
E canta, a felicidade, junto às cigarras dos fins de tarde

E me encontra ferido,
Num quarto de penumbra,
Num dia infeliz

E eu mergulho, perdido
Às mortais águas profundas
Ao seu derradeiro resgate.

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