domingo, 25 de janeiro de 2015

Há Séculos

Há séculos que não escrevo versos
Há versos que vidas inteiras não bastam pra se escrever
Que se extraem de supernovas, cerimônias guiadas 
Dores de cabeças tormentosas, praias noturnas 
Iluminadas pela sorte estável de estrelas
De mares incansáveis e o mistério inesgotável 
A vida, seus caminhos íngremes, suas estradas sinuosas 
Seus pontos de partidas e seu rumo eterno a lugar nenhum

Há séculos que penso haver encontrado amor 
O sentimento que toma a mim como o homem sedento à água
Os rostos que observo casualmente e sucumbo no torpor 
O tempo passando como o barcaceiro passa em torno da costa 
Rumo aos oceanos longínquos, as águas esquecidas do eterno
Mas ainda não encontrei fios com que canalizá-lo
Encerram-se nas minhas palavras e no inextinguível potencial
Enquanto corro ao horizonte; quase sem olhar pra trás 
Quase derrocando, quase dissolvido, quase esquecido

Penso todos os dias que encontrei a direção 
Que é mera questão tempo até que a vida venha até mim
Que nada perco em sonhar enquanto o mundo desmorona 
[Sonhos de profundo afeto; caótico mundo real]
Abraços mal pensados e abraços jamais esquecidos
Mãos, e olhos, e uma vida que não se resume à garrafa
Nem à crise nacional, nem ao preço iminente do dólar  
Talvez à paradisíaca caminhada através da costa deserta
O pôr-do-sol e uma noite eterna de luar
[Todo aquele grande coração...]

Caminho como um cego em direção a ti
Em todas as direções de todas as estradas 
Todas as placas, e semáforos, e lombadas 
Todas os rostos, e animais que nos obstrui o caminho 
Todas as praias, e cegos das beiradas, que pensam ver 
Todas as paradas pra café da manhã, almoço e jantar 
Todas as pistas de pouso e todos os voos 
Estou sempre em tua busca, inominável ateu 

És tu quem me acende o pavio 
E quem me inspira o eterno amor do qual escrevo 
Mas a partir do qual ainda não aprendi a viver 
Confino-me à tua sorte 

Agarro-me à lei da mudança
Meço minha vida através de quaisquer palavras escritas 
Neste mundo já não se fala do que traz relevância
Nós estamos todos mortos e ainda não entendemos
Nós temos, todos, amor em ambas as mãos, 
Mas preferimos encarar o vazio, enquanto a tocha se dissipa 
Dia mais, dia menos de solidão

O cigarro queima e a deliberada proliferação 
[Sinto-me como se estivesse vivendo numa cidade sem crianças]
E, se eu aprumar os pulmões e correr em qualquer direção,
Encontrarei, eu, em qualquer dessas esquinas do mundo,
As imagens e vívidas lembranças - luas cheias, dias imortais de sol
Que queimam como tíner no meu coração?
(Querido ser humano, pares de sofrer) 

Encontrarei lá fora tudo aquilo pelo que, dentro de mim, vivo?
Convenço-me de que o tempo trará o que carece de ser trazido 
Mas a quem quero enganar? 
Quem trouxe esperança ao homem enganchado na cruz? 
A esperança é a bela e suculenta maçã vermelha 
Presa entre os dentes do morto leitão 
É uma vela que brilha num outro planeta
É uma mentira sem sustentação 
(Pela qual vivo e escrevo versos
Pela qual morrerei com um sorriso, meu cadáver em putrefação) 

Sou só uma medíocre alma que não merece ser ouvida
Só uma faísca da colisão entre o vazio e o vazio
Um palerma menos lembrado que esquecido 
Apenas um homem na misteriosa e infindável busca
Do amor.

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